O BELO SEGUNDO S. TOMÁS DE AQUINO  

 

Aristóteles e, depois dele, S. Tomás defenderam não ser o Belo, nem inteiramente objectivo, nem inteiramente subjectivo mas sim simultaneamente objectivo e subjectivo. S. Tomás afirma-o quando define o Belo como sendo “aquilo que, ao ser comtemplado, causa prazer” (quod visum placet ). Por outras palavras, o Belo resulta da relação entre a realidade e um sujeito capaz de a apreender. 

No fundo, a realidade - vista como aquilo que é apreendido pelo intelecto - consiste na verdade; a realidade - vista como aquilo que é desejável e susceptível de ser possuído - consiste no bem; e, a realidade - vista como aquilo que é apreendido como desejável e aprazível– consiste no belo. 

Como tal, o belo afecta tanto o intelecto humano como o seu apetite ; mas, o apetite, deve ser afectado de tal forma que precluda o desejo de posse a ele associado,  limitando-se, a apreensão do belo, à calma serenidade da contemplação alcançada através intelecto.

Sendo assim, o belo, exige a realidade em toda a sua plenitude; exige uma integridade, que significa, não apenas uma ausência de defeitos, mas a riqueza da perfeição; exige uma proporção, uma ordem perfeita, um fulgor e uma claridade que traduzam a forma substancial ou princípio de perfeição e ordem (a essência) que, por detrás do envelope da matéria, surge abrasando a nossa inteligência.

O belo, provem da realidade - não dos sonhos. É algo impregnado da rica e esplêndida realidade e que é apreendido pelo intelecto humano, desinteressadamente, sem egotismo, com uma serenidade que afasta a obscuridade da paixão. 

É, exactamente devido a esta natureza do belo que a modernidade o despreza; porque a nossa época despreza a realidade; apenas se interessa por uma “realidade “superficial e parcial, apreendida pelos sentidos. Os filósofos modernos acorrentaram a humanidade ao mundo sensível, transformando o amor inato do homem pelo belo em algo que destrói o objecto de que se alimenta. Pois, se o apetite sensível do homem, se transformar no seu único apetite, então a sua busca da realidade transformar-se-á numa ânsia de possuir, numa procura desesperada, constantemente submersa num alvoroço de paixão, que só pode ser satisfeita com a absorção do objecto procurado. E, no fim, verificar-se-á que, até esse belo meramente sensível, - o único que estaria, agora, ao alcance do homem -, até esse,  invariavelmente lhe escapará.

Mas, pelo contrário, a escala do belo é a escala do ser, da actualização (instanciação, determinação, manifestação) da realidade. 

A idade moderna determinou que o homem devesse ficar pelo fundo da escala. Mas se ele subir, degrau a degrau, das formas dependentes da matéria, para as formas independentes da matéria - mas inerentes à matéria -, até à pura forma ou puro acto, que é Deus, terá alcançado, passo a passo,  mundos de sempre maior beleza. À medida que subir, a sua alegria tornar-se-á mais desinteressada, a sua contemplação mais penetrante e pura e o belo invadi-lo-á mais e mais intensamente até que a visão de Deus – puro ser e puro acto - o esmague com a Sua esplendorosa e suprema beleza. 

Desta definição do belo facilmente depreenderá que o pecado é um ataque ao belo porque é um ataque à realidade. O pecado é um ataque à integridade, à perfeição, ao esplendor do homem e dos seus actos; é uma acção humana defeituosa, corrompida, desordenada, que se revolta contra - e pretende destruir – a forma (forma substancial, essência) dos actos humanos a qual é a própria razão. 

De facto, não existe nada de belo no pecado; é uma deliberada invocação do feio que merce, sem dúvida castigo; é um deliberado ataque à ordem que deve ser prontamente contrabalançado por uma reposição da ordem; é um deliberado obscurecimento da luz, que merce uma justa privação do esplendor da luz.

O pecado é inimigo do belo, porque o pecado é inimigo da virtude. A virtude é o princípio que conduz a uma maior perfeição do homem, a uma plenitude dos poderes humanos sob a ordem perfeita da razão, cujo clímax é a perfeição última que consiste na união do homem com a Suprema Realidade (Deus) - principal objectivo da sua vida terrena.

 A virtude conduz o homem a uma cada vez maior beleza interior, a uma sua cada vez maior capacidade de captar a beleza exterior; leva-o a uma cada vez maior perfeição e a um cada vez maior domínio das faculdades inferiores.

 A serena contemplação necessária para a apreensão do belo só é possível quando as paixões estão dominadas pela razão e quando o amor é tão grande que se torna completamente desinteressado. 

O homem virtuoso caminha, pois, no meio da beleza, em direcção ao Belo Supremo que é, simultaneamente, a fonte de tudo que é belo; porque o homem virtuoso dirige-se pelos caminhos da razão até à sua morada eterna,a qual é o próprio Deus. 

 

A Companion To the Summa, Volume II, Sin´s Results, Chapter XVII – The Results Of Unhappiness, (Q. 86-89), Walter Farrell.

 

(Traduzido do Inglês por JFM)

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