O que Vemos e o que não Vemos

 

No seu ensaio de 1850 "O que Vemos e o que não Vemos", Bastiat introduziu um conceito fundamental para a compreensão das origens do conflito na Ucrânia. Este conceito é conhecido como "Custo de Oportunidade" e, para ilustrar o seu funcionamento, precisamos de recuar no tempo.

Na era das sociedades tribais, cada membro individual da tribo partilhava um conjunto comum de conhecimentos: como esfolar uma cobra, ler um trilho, reconhecer as 37 variedades diferentes de neve, identificar plantas comestíveis e não comestíveis, construir um abrigo, acender uma fogueira. Este conhecimento era essencial para a sobrevivência individual e do grupo; era uma propriedade comum partilhada entre todos os membros do grupo e transmitida ao longo das gerações.

Em contraste, na nossa era moderna, vivemos uma especialização extrema do conhecimento, com cada função laboral a exigir a posse de educação e conhecimentos únicos. O, leitor, por exemplo, depende inteiramente da bondade dos outros. Não sabe como cultivar os seus próprios alimentos, reparar o seu carro, programar um computador, fazer as suas próprias roupas, encontrar a estrela polar e navegar de x para Y, aplicar uma cataplasma. A grande maioria dos americanos, por exemplo, é incapaz de evitar uma dieta autodestrutiva.

Esta forma de dependência em massa é conhecida pelo nome de "progresso".

O princípio do custo de oportunidade, descrito pela primeira vez por Bastiat, é fundamental para entender a era moderna. Se gastarmos o nosso tempo a ganhar créditos em programação informática, não podemos gastar a mesma quantidade de tempo a ganhar créditos em agricultura biológica.

Os sete anos passados a obter um doutoramento em economia são à custa de não passar os mesmos sete anos a compreender as leis da física, ou a estrutura geológica dos reservatórios de gás de xisto, ou como combater um incêndio numa estrutura, capitanear um navio de alto mar ou tratar a hipotermia.

Em suma, o custo de oportunidade de uma licenciatura de sete anos em economia são sete anos de oportunidades perdidas para se dedicar a qualquer outra área de estudo; quanto mais se sabe sobre economia, menos se sabe sobre qualquer outro tema.

 À medida que a sua educação progride, o estudante passa invariavelmente a saber cada vez mais, sobre cada vez menos e, quando se adquire a educação suficiente, sabe-se absolutamente tudo sobre quase nada. Ser-se-á, então, um "especialista" – um sujeito que sabe tudo, sobre quase nada; e não sabe nada, sobre tudo o resto.

A extrema especialização da sociedade contemporânea resulta na criação de uma população cada vez mais ignorante sobre todos os temas que saiam fora da sua extremamente limitada área de especialização.

 Por outras palavras, a modernidade produz uma sociedade cada vez mais ignorante.

Este estado de ignorância intensa é agravado pelas exigências extremas de tempo existentes na sociedade industrial moderna. Por comparação, até há época moderna, as populações viviam em autênticas sociedades de lazer.

O horário diário dum “funcionário público” na Idade Média, em Portugal era de 3 horas; um estudo realizado na década de 1960 concluiu que os, nas tribos ditas primitivas os seus membros tinham de trabalhar em média 12 horas por semana para conseguirem sobreviver - uma pequena fracção das horas semanais exigidas para se poder sobreviver na sociedade moderna, se contabilizarmos os tempos de deslocação.

 E, até há bem pouco tempo, todos trabalhavam ao pé de casa e se resolvessem não trabalhar um dia, nada de especial lhes aconteceria.

 Na era moderna, a maior escassez é a de tempo; poucos o têm de sobra. E, como tal, o custo de oportunidade de perder tempo a adquirir conhecimento não é reconhecido nem compreendido. Os próprios "especialistas", embora dominem a "técnica" da sua disciplina, muitas vezes demonstram não saber os seus fundamentos, simplesmente porque as universidades deixaram de ter tempo para perder com semelhantes frioleiras. 

Uma sociedade que exibe tal grau de ignorância por força dos referidos custos de oportunidade, acaba necessariamente por desenvolver uma dependência extrema das explicações "oficiais".

É preciso tempo para compreender minimamente a maioria das complexas questões modernas e o custo de oportunidade dessa compreensão implicaria uma redução do tempo de lazer, ou de outras actividades essenciais para a sobrevivência do posto laboral, da carreira, etc.

 É mais fácil aceitar aquilo que dizem os "peritos", os “especialistas”, os “comentadores”, os "políticos".

O resultado é uma população cada vez mais vulnerável à manipulação através de técnicas de formação de opinião; situação agravada pela concentração da propriedade dos meios de comunicação social numas quantas mãos, dando azo a autênticos tsunamis de propaganda monoliticamente unificada.

O cidadão comum não tem tempo para investigar as eventuais falsas alegações emitidas pelo Estado ou pelas corporações e só quando a questão se torna  por de mais evidente (como no recente caso americano do "travesti no anúncio duma marca de cerveja") é que o público começa a revoltar-se.

Esta ignorância causada pelos custos de oportunidade tem mico e macro efeitos. Os efeitos micro foram ilustrados, por exemplo, em relatórios, recentemente vindos a público, que mostravam a forma como os instrutores da NATO treinavam os combatentes ucranianos com armamento que os próprios instrutores não faziam ideia de como se manuseava ou carregava. As fotografias mostravam-nos a ensinar elementos da AFU a carregar metralhadoras DShK com munições inadequadas.

Como um soldado ucraniano salientou, numa entrevista, os "peritos" da NATO não faziam a mínima ideia de como manusear as armas que estavam a dar aos militares ucranianos que, nem por isso, deixaram de enviar, para serem dizimados na linha da frente do conflito.

Os efeitos a nível macro são igualmente perniciosos. A ignorância causada pelo custos de oportunidade leva, mais tarde ou mais sedo a uma autêntica inversão da realidade; à conta de viverem numa redoma psicótica as elites políticas e financeiras do ocidente tomaram decisões totalmente auto-destrutivas, como a loucura do combate ao “vírus”, ou o delírio do combate às “alterações climáticas”, ou a insanidade da aposta nas “energias sustentáveis”, ou a burrice da desindustrialização em curso na Alemanha, ou o criminoso fornecimento de muitos biliões em armas e dinheiro dos contribuintes a um regime inqualificável que persegue e bombardeia as próprias populações em nome da democracia.

Mas, a verdade vem sempre ao de cima. Fá-lo-á instantaneamente, num relâmpago incandescente ou lentamente ao ritmo dum “especialista” da NATO a tentar inserir munições de calibre incorrecto numa desactualizada DShK.

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