The safest general characterization of the European philosophical tradition is that it consists of a series of footnotes to Plato.
Alfred North Whitehead, Process and Reality, p. 39 [Free Press, 1979]
As virtudes cardeais são a Prudência
(Sabedoria), a Fortaleza (Coragem),
a Temperança (Moderação) e a Justiça.
São assim chamadas porque são tradicionalmente consideradas como a
"dobradiça" (cardo) sobre a
qual gira o resto da moralidade.
Encontramo-las discutidas na República de Platão e com uma exposição
ainda mais sistemática na Summa Theologiae de São Tomás de Aquino.
Para Platão, estas virtudes estão relacionadas com as três partes principais da alma e com as três classes sociais principais que lhes correspondem, na sua cidade ideal. A sabedoria (sophia) é a virtude caraterística da parte mais elevada da alma - a parte racional - e da classe mais elevada da cidade, os reis-filósofos governantes. A coragem (andreia) é a virtude caraterística da parte média da alma e dos soldados que constituem a segunda classe social da cidade. A moderação (sophrosyne) é o atributo caraterístico da parte mais baixa e apetitiva (virada para a satisfação dos apetites) da alma e da classe mais baixa e produtiva da cidade. A justiça (dikaiosyne), por sua vez, é a ordenação correcta das três partes da alma e da cidade, cada uma fazendo aquilo que é inerente à sua natureza.
Quando a razão está no comando e a parte espiritual da alma - ou seja, a parte movida por um sentido de honra e vergonha - está a cumprir as ordens da razão, mantendo a parte apetitiva da alma sob controlo, apenas permitindo que os seus apetites sejam satisfeitos quando a razão o determina, a alma é justa. E, a cidade é também justa, quando os reis-filósofos - aqueles que são motivados por uma busca racional e desinteressada do bem da cidade - estão no comando da cidade e os soldados seguem a sua liderança e a classe produtiva concentra a sua atenção naquilo para que é mais apta (agricultura, construção, artesanato e afins). A injustiça é um desvio desta ordem - verifica-se quando a parte apetitiva domina a alma, ou os soldados ou a classe produtiva dominam o governo da cidade.
A famosa análise de Platão dos quatro principais tipos de regimes injustos desenvolve este tema. Uma timocracia, ou seja, uma sociedade orientada para a honra, coloca as virtudes militares à frente da razão. Esta é, na perspetiva de Platão, uma forma desordenada, mas ainda assim a menos má de cidade injusta, uma vez que pelo menos há um padrão objectivo e não apetitivo - a vontade de perseguir o que é honroso e evitar o que é vergonhoso - que foi idealizado. Uma sociedade oligárquica, ou seja, orientada para o dinheiro, é pior, porque é conduzida pela parte apetitiva da alma, mas ainda assim não é o pior tipo de regime, uma vez que o perseguidor da riqueza, pelo menos, deve acorrentar os seus apetites até certo ponto, respeitando os valores burgueses, como a parcimónia e o pensamento a longo prazo. A democracia, tal como Platão a entende, é ainda pior, uma vez que coloca efetivamente os apetites mais baixos no comando da Cidade. Tal como os impulsos pela comida, sexo e bebida, nunca ficam satisfeitos e entram em competição, dominando uma alma individual degenerada, uma sociedade democrática é dominada pelos mesmos impulsos e a sua vida social e política são caóticas, caracterizadas por modas passageiras e resistentes à ideia de que possa haver um padrão permanente e objectivo contra o qual as modas e os impulsos possam ser julgados. A tirania, o pior tipo de regime, é essencialmente o que resulta quando uma determinada alma democrática, movida por apetites especialmente fortes, impõe a sua vontade às restantes.
Ora, é fácil verificar que, em cada um dos casos, a
contra-virtude moderna implica uma viragem do Objectivo para o Subjectivo - de um
enfoque na forma como as coisas realmente são, para um enfoque na forma como se
acredita ou deseja que elas sejam.
A tolerância, pelo contrário, recusa-se a condenar essa indulgência. A tolerância trabalha em conjunto com a empatia, assim como a moderação trabalha em conjunto com a coragem. Tal como a coragem é a aliada da razão para manter os apetites à distância, lembrando-nos que é fraco e vergonhoso ceder quando a razão diz que não devemos, também a empatia é a aliada da parte apetitiva da alma na sua guerra contra a razão, dando-lhe permissão para ceder e ignorar o que a razão, cruel e insensível, está a dizer. A coragem e a moderação ordenam: "Tu és um ser humano! Não te comportes como um animal!" A empatia e a tolerância respondem: "Nós compreendemos, vai em frente, no fim das contas, és apenas um animal!"
A justiça trata os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual. A equidade trata toda a gente de forma igual; ou melhor, trata toda a gente de forma que aquele que se atrever a gritar "Injustiça!" perante uma injustiça, deve ser considerado doido e submetido a tratamento.
Edward Feser
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